Autonomia e independência da Advocacia Pública: caminho para construção de função essencial à Justiça
29 de março de 2025, 13h18
Seguindo a mesma linha de inúmeros outros países democráticos, a nossa Constituição previu a existência de três Poderes, independentes e harmônicos entre si: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Ao tratar da organização dos Poderes, no Título IV, a Carta Magna tratou nos três primeiros capítulos de cada um deles, separadamente. Mas não parou por aí.

Diante dos desafios de uma sociedade cada vez mais complexa e de uma democracia ainda em construção, inovou o constituinte ao estabelecer, no capítulo seguinte, estruturas que, por sua relevância e atuação transversal, mereceram tratamento apartado.
São consideradas funções essenciais à Justiça, portanto, alçadas ao mesmo patamar constitucional, o Ministério Público, a Advocacia Pública e a Defensoria Pública.
Não se olvide que, no âmbito federal, o papel ora desempenhado pela Advocacia Pública era até então desenvolvido pelos procuradores da República, realizando a defesa da União.
Defesa da União
Coube então, a partir de 1988, à Advocacia-Geral da União assumir a defesa judicial e extrajudicial da União, que engloba todos os três Poderes, e, simultaneamente, realizar a consultoria e o assessoramento jurídico do Poder Executivo.
Apesar da relação mais próxima com o Poder Executivo, em razão da atividade de aconselhamento que desempenha, incumbe à Advocacia-Geral da União zelar também pela independência e harmonia entre os Poderes. Desse modo, atuando na defesa judicial e extrajudicial da União, deve a AGU ponderar todos os interesses envolvidos, perseguindo o equilíbrio na sua atuação, exercendo essa relevante missão com autonomia e independência.

O desejo constitucional, no entanto, restou limitado por uma concepção que vislumbrou apenas a conexão da Advocacia Pública com o Poder Executivo. A AGU, de função essencial à Justiça, ou a ser vista por alguns apenas como um ministério. E o advogado-geral da União, por sua vez, equivalente a mais um ministro.
Olvidou-se, dessa forma, o papel essencial da Advocacia Pública no Sistema de Justiça brasileiro, fundamental para a resolução de conflitos e para a garantia dos direitos do cidadão.
O mesmo não ocorreu com o Ministério Público, cujos contornos restaram mais claros desde o nascimento da Constituição. A Defensoria Pública, por seu turno, teve de trilhar o percurso necessário para o pleno desenvolvimento do seu papel, principalmente com a edição da EC nº 80/2014, que lhe conferiu autonomia e a colocou no seu devido patamar.
Advocacia Pública sem mesmos recursos
A Advocacia Pública, porém, apesar de ter sua importância e trabalho cada vez mais reconhecidos, do ponto de vista de estruturação institucional e de realização do projeto constitucional segue estanque.
Veja-se que, comumente, atuam nos mesmos processos judiciais — às vezes no mesmo polo, às vezes em polos distintos — a Advocacia Pública, a Defensoria Pública e o Ministério Público, cada um buscando desenvolver o seu mister.
É perceptível, no entanto, que a Advocacia Pública, no seu papel de defesa das políticas públicas, não está dotada dos mesmos recursos, estrutura, autonomia e prerrogativas das demais funções essenciais à Justiça. Apesar de colocados em mesmo patamar no âmbito constitucional e atuando não raras vezes nos mesmos processos, na prática não se vê equilíbrio e nem tampouco paridade de armas no desempenho de suas funções.
A PEC nº 17/2024, em trâmite no Congresso, tem como finalidade reduzir esse desequilíbrio e dotar a Advocacia Pública dos recursos necessários para que possa desenvolver plenamente o seu papel. Não apenas sob a perspectiva de defesa do Poder Executivo, que é extremamente relevante, mas perante todos os Poderes da União, com os quais também têm responsabilidade.
Não se pode perder de vista, contudo, que a meta final deve ser a construção de uma Advocacia Pública autônoma e concretizadora dos direitos dos cidadãos. Isso porque o interesse público, tutelado pela União, pressupõe o pleno cumprimento das leis e da Constituição. É para esse fim, em última instância, que todos os Poderes e funções essenciais à Justiça devem se voltar. E o caminho para isso, no caso da Advocacia Pública, já está traçado. Resta-nos agora avançar.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!